Segunda parte da matéria sobre o artista Dan McCaw. Continuando o que começamos no post anterior aqui veremos alguns passos que podem nos guiar nessa jornada artística de auto conhecimento. Baseado em um capítulo de seu livro ‘A Proven Strategy for Creating Great Art’ (Uma Estratégia Comprovada para Criar uma Ótima Arte).

RENDERIZAÇÃO X EXPRESSÃO

Quando começamos a pintar, muitos de nós colocam como objetivo aprender a retratar coisas de forma realista, o mais fiel possível quanto conseguimos. Renderizar – que eu considero aprender a usar os princípios básicos da arte como forma, valor, cor e assim por diante – parece como magia pura. Mas aprender a renderizar é simplesmente uma habilidade adquirida. Quanto mais fazemos e mais entendemos luz e forma, mais nos tornamos adeptos ao ato de renderizar.

Nos aventurando a desenhar o que vemos irá afiar nossa habilidade de observar. Renderizar é um exercício do olho, mente e mãos. O olho vê de forma tridimensional e a mente traduz em duas dimensões, a qual a mão executa. Renderizar nos possibilita a analisar e entender forma e luz. É uma ferramenta valiosa na nossa prateleira de escolhas artísticas. Mas pode o ato de renderizar comprometer a visão criativa? Isto pode, se nos tornarmos prisioneiros da forma e temer a validade de nossa voz criativa.

Dominando a ferramenta essencial de renderizar é algo como dirigir um carro. O propósito todo de aprender a dirigir um carro não é o carro; é sobre ir para uma viagem ou jornada. E assim é com a arte. Uma vez que nós aprendemos os fundamentos básicos, você pode fazer mais do que apenas manter o carro na estrada – você pode ir atrás de uma aventura.

DESENVOLVENDO UM PONTO DE VISTA

Eu acho que a coisa mais importante que um artista pode empenhar-se é por sua voz individual. Uma pintura expressiva significa olhar para o modelo, a paisagem ou os objetos de uma natureza morta, e ver quais oportunidades são oferecidas com cada tema. Ao invés de olhar para o tema e trazer para nós mesmos, como artistas iniciantes fazem, nós devemos aprender a perguntar: Quais coisas dentro de mim eu posso trazer para fora com este tema? Como artistas maduros, nós devemos mirar e revelar o que está dentro de nós.

Aprender a trazer o que está dentro de você, a falar com sua própria voz, começa com fazer contato com sua sensibilidade. Cada um de nós tem elementos intrínsecos que nos fazem sentir bem. Comece procurando os seus. Não aceite apenas o que é dado para você. Vá atrás, procure e caçe – esteja receptivo para aquilo que move você. Pode ser sombra, padrões, movimento, texturas, cheiros ou outras artes. Faça uma coleção. Mantenha uma lista. Pendure imagens.

Então, antes de começar a pintar aquela cena ou conceito que atrai você, tire um momento para pensar sobre o porquê de você estar começando. Identifique o que interesse que te impulsiona. Antes de você poder interpretar o tema de maneira significativa, você tem que cavar fundo e pensar sobre. Pergunte a si mesmo: O que estou fazendo? Como eu me sinto a respeito do tema ou situação que estou pintando? Qual é o sentimento ou o estado de espírito que estou gerando? E mais importante: O que eu estou tentando dizer com esta pintura? Lembre-se de suas respostas. Escreva-as e releia frequentemente.

Esse tipo de processo de pensamento irá permitir você a desenvolve um ponto de vista e aprimorar o que você está tentando expressar. Outro conjunto de pensamentos irá ajudar você a começar relacionar tudo a essa visão, essa harmonia, essa combinação de coisas: Como eu posso colocar elementos juntos que relacionam com minha direção particular e pretendida? Em que grau cada elemento suporta meu ponto de vista? Eu preciso simplificar alguns elementos e exagerar outros? Você tem que ser bem seletivo no que você tira e como apresenta o resto. Ter um ponto de vista ou uma direção coloca você – não o seu tema – no controle. É como se você fosse um diretor de cinema, e você o que o personagem principal será, que direção o filme irá tomar e quais ideias irão dar suporte para direção do filme.

Por fim, a procura que irá tomar conta em toda pintura é: Como eu posso tornar isso meu? Como eu posso identificar com o assunto, e ainda manipular de acordo com minha interpretação individual? Respondendo essas questões é o fundamento básico de toda pintura de minha carreira e deve se tornar a motivação por trás de seu trabalho. Exagerando, editando, simplificando – essas são as decisões que nos permitem a desenvolver nossa criatividade própria, nossa voz interna. E isso é onde a “arte verdadeira” reside – na interpretação do objeto, natureza morta e paisagem.

IDENTIFICANDO COM O PASSADO

É só nós olharmos a história da arte para ver o valor permanente e a importância da individualidade. Pense em Rembrant e Velázquez, em Van Gogh e Sorolla, os mestres modernos como Vuillard, Bonnard, Klimt, Klein. Cada um deles tiveram diferentes interpretações, idiossincrasias e personalidades, e ainda assim tiveram a mesma e grande convicção que direcionaram eles – a procura por uma voz interna pessoal. Suas vozes foram tão fortes que os modelos, paisagens ou objetos nunca dominaram ou controlaram elas. Para eles, o tema era apenas um estágio onde suas vozes eram ouvidas. Nós ainda podemos ouvi-las falando hoje.

Quando nós percebemos que cada peça de trabalho que eles produziram encantaram e tiveram um impacto real em diferentes grupos de espectadores através da história, nós devemos ser encorajados. Isso prova que nós também podemos comover os outros com sensibilidade similar da nossa maneira, se e quando nós procurarmos por estas sensibilidades intrínsecas e individuais e expressá-las.

AMPLIANDO SUAS PERCEPÇÕES

Procurar as respostas e soluções para estes tipos de questões que permitam a você expressar seu ponto de vista podem parecer intimidantes a princípio. Não tem problema não saber todas as respostas sendo que a criatividade repousa na incerteza. A expressão verdadeiramente original nunca pode ser planejada antecipadamente. Criatividade apenas acontece quando você desapega e permite que a natureza de seus materiais e gestos espontâneos guiem o caminho. Experimentação significa estar disposto a sair da zona de conforto e entrar num novo território sem saber o que virá. O truque para tocar no seu poço de criatividade é manter fresca e expandir sua imaginação tanto quanto for necessário. Eu chamo de “Ampliando suas Percepções”.

Uma maneira é começar a ‘re-treinar’ seus olhos e seu cérebro para perceber as coisas de forma diferente. Por exemplo, tentar olhar para uma maçã em uma mesa como um círculo em um quadrado ou algo suave contra algo duro ou mesmo ativo contra passivo. Ao invés de perceber um dia chuvoso como escuro, sombrio, solitário e frio, note a maneira como uma luz vermelha de um semáforo parece ser muito mais brilhante contra uma atmosfera cinza. Quando você olha para as nuvens, procure por faces. Algumas pessoas nunca irão ver a diferença entre a textura de uma calçada e a suavidade do vidro da janela. Elas não notarão como as pessoas caminham em diferentes passos ou como as árvores criam padrões negativos nas formas (silhueta). Mas para aqueles de nós que olham com o olhar de um artista, o mundo é uma matriz infinita de lindos presentes.

Qualquer tema pode se tornar um trampolim para sua imaginação quando você começa a jogar o jogo do “ E se?…”. Na sua mente, visualize um objeto e então pergunte: “E seu eu exagerasse ele? E se eu manipular, distorcer ou mudar?” Por exemplo, e se eu pintasse uma maça vermelha com sombras roxas? Tente coisas diferentes. Não tem uma solução errada – apenas o que parece bom para você e o que não o atrai.

Finalmente, outro caminho para ampliar sua percepção é se cercar de artes que sejam interessantes para você, seja um Vuillard, Motherwell, Renoir ou um Van Gogh. Olhe a arte representativa ou a não-objetiva para descobrir o que move você. Isso sempre ajuda porque traz para você os pontos de vista dos artistas. Mostra a você como eles desviaram do que estava na frente deles para interpretar com suas individualidades.

Ampliando suas percepções cria escolhas, e escolhas cria individualidade. Quando nós temos opiniões, nós podemos escolher o que nos atrai naquele momento. Mas não espere desenvolver essas habilidades da noite pro dia. Esta maneira de pensar é parte de uma jornada vitalícia de autoconhecimento.

APRECIE A JORNADA

Você pode temer não ter o que é necessário para formar uma opinião que valha compartilhar, muito menos expressá-la, mas eu prometo a você, sua voz está aí. Você pode falar de forma suave, mas você tem que confiar que ela existe, esperando sair. Todos nós temos algo que precisa ser dito, e seja lá o que for, vale a pena ser dito. A busca artística é simplesmente um esforço para libertar essas parte de nós que quer ser ouvida, mesmo quando nós não estamos tão certos do que significa. Eu garanto a você que quando eu procuro por essas coisas que intrinsecamente me movem, minha voz sai pra fora.

Tanto como pedalar uma bicicleta num dia frio irá aquecê-lo, mover sua mão sobre uma tela (ou papel) nova irá fazer sua criatividade fluir. As opiniões e ideias que você dá voz não precisam ser revolucionárias – elas precisam apenas ser sinceras. Alguém em algum lugar do mundo irá responder ao que você tem a dizer, de como você vê o mundo.

Considere isto: algumas pessoas vão ao Grand Canyon e ficam maravilhadas, encantadas, excitadas. Outras pessoas acham apenas um grande buraco. Algumas pessoas vão ao museu e veem uma obra de arte que as tocam, enquanto outras podem olhar a mesma obra de arte e ir para a próxima, como se aquela nem existisse. Porque isso? Objetos não dão à você emoção; você já contém essa emoção. Um objeto apenas traz a emoção para fora. Arte é do mesmo jeito. Ela traz uma razão para aquele pensamento, para aquele clima, aquele sentimento que existe dentro de você para a superfície. Ela conecta e acorda aquela parte de nós que nós já possuímos. Ou com o tempo, descobrimos que possuímos.

Você não terá sucesso em trazer sua individualidade em todas as pinturas. Mas tudo bem. Se você vender uma pintura ou não, olhe para o que você está fazendo para si mesmo. Olhe o que você esta fazendo para si por tentar. A frustração que você pode experimentar na avaliação final de alguns ou de todo seu trabalho é como um amigo dizendo que você pode fazer melhor. Alguns dias, você irá duvidar se é um artista. Eu ainda questiono isso, constantemente na verdade. Mas a sensação de explorar, de procurar e de crescer tem que ser maior que a dor do fracasso ou o medo do julgamento dos outros. O que é essencial, eu penso, é que você não tem que ter medo do crescimento. Não tema a mudança; tenha medo de nunca mudar.

Agora é sua vez de embarcar numa nova jornada na qual você irá começar a aprender a aplicar os fundamentos de forma mais pessoal para expressar você mesmo. As possibilidades são ilimitadas. Mas, como um carpinteiro que usa suas ferramentas para trazer sua visão de uma ótima peça de mobília à vida, você deve primeiro aprender a usar os fundamentos como ferramentas para comunicar sua voz interna na tela.

PONTOS PARA SE LEMBRAR

  • Criar arte expressiva demanda mais do que apenas renderizar. Requer que você desenvolva e dê voz para seu ponto de vista
  • Individualidade vem através de muitas opções. Você pode aumentar suas escolhas ampliando suas percepções, aumentando sua consciência e exercitando sua imaginação.
  • Você provavelmente não terá sucesso expressando sua individualidade em toda pintura, mas nao deixe isso fazer você parar de tentar. Seus esforços para expressar a si mesmo irão mantê-lo motivado pela vida toda. Confie na sua habilidade inata para trazer para fora sua voz interior.

Se você se inspirou com o trabalho e as palavras de Dan McCaw, assista a esta entrevista (em inglês) para o canal de Anne Ward. Vale a pena ver.

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